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CAMPO & CIDADE

Arborização urbana - Onévio Zabot

  • - Onévio Zabot - Engenheiro agrônomo e servidor de carreira da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (Epagri) - Membro da Academia Joinvilense de Letras

Arborização urbana, eis um tema instigante. Basta circular por ruas e logradouros de qualquer cidade para perceber a importância dela. Ecossistema urbano. Ao longo de ruas e avenidas, em praças e parques ou remanescentes de vegetação nativa, a presença do verde traz não apenas conforto térmico, mas sobretudo sensação bem estar.

Obviamente, com a vegetação refestelam-se toda sorte de aves, e toda a fauna silvestre: insetos e todas as espécies de vertebrados e invertebrados a ela associados. É instigante a fitogeografia pondera Raul Cânovas, eminente paisagista. Embora referência mundial em paisagismo, não lhe falta a modéstia ao reconhecer:- "Fitogeografia, ainda vou dedicar-me a isso". Na obra a Invenção da Natureza
(Virginia Wulf, 2015)) que gira em torno da epopeia de Alexander Von Humboldt por diversas regiões terráqueas, especialmente na América Latina, percebe-se a presença desse mantra sagrada que é a vegetação. A distribuição, variação de espécies, sem dúvida uma fotografia maravilhosa do planeta. Reflete o clima, a terra; altitudes e latitudes. E. sobretudo amplitudes.

Às considerações: inicialmente o homem temia a natureza, pois a desconhecia. Mas por outro lado, a venerava. Deusa imprevisível, mas ao mesmo tempo generosa. A mitologia não deixa de ser uma senha, forma preciosa de auscultar esse prodigioso elo. Cordão umbilical do mundo. No entanto, com a urbanização, o homem distancia-se das matas. Aliena-se. E, gradativamente, a supressão cede espaço à agricultura e a criação de animais domesticados. Lefebre é taxativo quanto a esse processo maquiavélico: "A cidade é um lugar de consumo, e um consumo de lugar". Esse processo por razões que escapam a este texto, acentuou-se ao longo da história. Em face desses novos povoamentos e conglomerados urbanos, coube ao campo garantir mesa farta. Nem sempre compreendido, porém servo abnegado, subserviente.

O Brasil é desses hinterland - paraísos perdidos -, que ainda dispõe de florestas nativas. Quem as preservou, poucos a reconhecê-lo, muitos a espezinha-lo. Há países, caso da Holanda, cuja território é totalmente urbanizado. No entanto, embora a urbanização, a Holanda é um grande produtor de alimentos e o maior entreposto de gêneros alimentícios do mundo. Sem falar na floricultura, pujante sob todos os aspectos. Como conseguiram isso? Obviamente com planejamento integrado e participativo. Visão holística. Dentro deste contexto, a arborização urbana, cada vez aparece na ordem do dia,inclusive no planejamento urbano. Urbano, ressalte-se. Quanto ao rural, essa é outra história. Entregue à própria sorte, agoniza.

Segundo Cânovas, Porto Alegre se destaca nesse quesito: parques, praças e outros logradouros públicos ou privados, devidamente arborizados e ajardinados. Segundo Henrique Deckmann, vereador em Joinville, no Parque Farroupilha ao final da tarde, familiares e amigos se reúnem para uma boa mateada. Coisa de gaúcho. Equivale ao chá dos ingleses. Buscam os gaudérios espaço aberto, forma de evadir-se dos apartamentos e encontra-se com a vizinhança, e fazer novas amizades. Ou por outra: uma basta à solidão do mundo, decantada por Drumonnd de Andrade no poema: Estou Só na América.

Na obra: Frutíferas Nativas Úteis à Fauna na Arborização Urbana, tese de mestrado apresentada por Maria do Carmo Conceição Sanchotene (1983) são descritas 99 espécies que se distribuem pela grande Porto Alegre. Mais tarde, em 2015, Harri Lorenzi e coautores publicam: Frutas do Brasil, Nativas e Exóticas (de consumo in natura).
Harri Lorenzi, filho de Corupá, antiga Hansa Humboldt, notabilizou-se no paisagismo e na fitogeografia brasileira ao descrever espécies referenciais tanto do ponto de vista paisagístico, quanto de aproveitamento de folhas, frutos e madeiráveis. Sua obra é um divisor de águas. No Jardim Botânico que mantém em Nova Odessa, Estado de São Paulo, preserva expressiva coleção fruto de incursões pelos mais distantes rincões. Um pequeno jardim de Éden, certamente. Ali recebe aficionados do mundo todo.


Devaneios à parte, vamos ao ponto. Neste momento Joinville discute um Planode Arborização Urbana. Certamente, uma inciativa louvável, pois vai interagir como marco regulatório. Uma coisa é o plano outra, no entanto bem diferente: a sua implementação.
Historicamente a arborização urbana em Joinville andou aos solavancos. Digitaisdo acaso. Percebe-se isso ao circular pelas ruas, identificando espécies. Algumas tecnicamente recomendáveis, outras não. Estrangulamento de raízes, tragédia a olhos vistos. Calçadas partidas. Rachadas. Descalabro.

Mas, certamente, o calcanhar de Aquiles é ausência de um Horto Municipal devidamente estruturado. Equipe e colaboradores motivados. Horto do Zoobotânico levado a termo por Osni Piske, então Secretário de Serviços Públicos, juntamente com programa "Adote uma Praça" (hoje Parceira Verde), foi uma iniciativa louvável. O prefeito Wittich Freitag por insistência de Dona Lili, sua esposa, deu um impulso significativo ao à arborização urbana. Contrataram os Engenheiros Agrônomos Luiz Camargo e Alberto Schweitzer para coordenar o setor. Criaram o Horto Florestal na Vila Nova que, em outra administração, foi transformado em conjunto habitacional.
Irineu Bornhausen. Perdeu-se com isso toda a coleção de plantas ali desenvolvidas.

Fato lastimável. Passou ao largo, no entanto. A imprensa calada e muda, os moradores a ver navios. Registre-se também a presença paisagistas como Jordi Castan, Juliana Metz, Mauro e Ivana, Beto Amaral e de produtores - caso de Roberto Drephail -, que contribuíram sobremaneira para qualificação paisagística. E a Epagri com os cursos de jardinagem e floricultura. A Festa das Flores também contribuiu e contribui, especialmente quanto ao cultivo de orquídeas.

Resumindo: arborização urbana pressupõe esforço coletivo: técnicos e gestores. E, sobretudo o envolvimento da comunidade. Para isso o Horto Municipal é a chave, o porto seguro, a cabeça de ponte, que o digam Porto Alegre e Itajaí e tantas outras cidades cuja arborização encanta.
Quanto as espécies frutíferas, podem ser produzidas em viveiros particulares, mas sobretudo no Horto Municipal. E, este leque é vasto, pois estamos no Bioma Mata Atlântica, um dos mais diversificados do mundo. Porto Alegre elencou 99 nativas, um recorde.
Na região, entre essas preciosidades podemos elencar: aroeiras, araçás, ingás, grumixamas, gerivás, juçaras, butiás, cambucás, bacoparis, jabuticabas, pitangas, gabirobas, amoras silvestres, canelas, landim, figueiras, cerejeiras, guamirins, guabijús,uvalhas, corticeiras, aguaís, grandiúvas e tantas, tantas outras. Centenas de espécies.

Todas majestosas, frutíferas por excelência. Mãos à obra, portanto; começando por implantar um horto à altura da cidade dos príncipes.
Joinville, 12 de fevereiro de 2022

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